Peça do acervo Paiol - Foto Peneliope Bianchi
Assim como na tradição local, Noemisa começou a modelar o barro ainda na primeira infância, quando acompanhava sua mãe, também ceramista, na confecção de peças utilitárias que serviam para complementar a renda da família de lavradores. Assim como a maioria dos artesãos da região, ela usava o barro para fazer pequenos brinquedos para embelezar a simples infância no sertão. Com o passar do tempo, o destaque para suas criações se deu pelo fato dela ser uma das primeiras a ir na contramão das peças utilitárias que eram mais comuns à época.
“Sem uma preocupação muito grande com a função do objeto, ela passou a retratar o cotidiano do vale, trazendo os animais, as pessoas e cenas específicas ligadas às celebrações populares, como casamentos e batizados, além de peças com contexto religiosos, como igrejas e presépios. Como ela tinha a ludicidade muito aflorada, ela também representava contos antigos como o caso da onça que queria ir ao baile com o coelho, além de auto representações que ora aparecem de forma mais fiel, ora de maneira imaginada”, completa Lassen.
Com uma obra delicada, Noemisa se voltava aos detalhes. Os motivos florais aparecem nos vestidos das mulheres, na fachada das igrejas, nas toalhas de mesa e até mesmo na “vida real”, em sua própria casa que era adornada com flores pintadas em seu entorno. A diferenciação de suas criações a levou para inúmeras mostras em Minas Gerais e outros Estados. Em 1987 esculturas suas integraram a exposição “Brésil, Arts Populaires” no Grand Palais, em Paris. Já em 2000, algumas peças também integraram a “Mostra do Redescobrimento”, da undação Bienal de São Paulo. Além disso, sua arte está no acervo permanente do Museu de Folclore Edison Carneiro (RJ), no Museu da Casa do Pontal (coleção de Jacques van de Beuque), no Museu de Arte Popular Brasileira do Centro Cultural de São Francisco, João Pessoa (PB), além de dezenas de coleções particulares dentro e fora do país.
| | Sobrinhos da artista também viraram ceramistas e buscam manter o legado da tia - Fotos Lucas Lassen e Penellope Bianchi
Embora ela nunca tenha se casado e nem tenha tido filhos, a relação familiar tanto com o manejo da terra, quanto com a modelagem do barro, continuam fortes. Atualmente, dois de seus sobrinhos continuam levando seu legado adiante. Aos 46 anos, José Nilo Francisco do Santos, filho de Olinto Batista do Santos (irmão de Noemisa), enveredou pelo mundo das artes por volta dos 10 anos de idade. “Na nossa família, a cerâmica chegou muito antes da tia Noemisa, mas foi com ela que eu fui aprendendo a partir da observação. Depois, comecei a arriscar fazendo uma coisinha aqui e outra ali, até que ela foi nos ensinando as técnicas”, revela José, que também é lavrador e trabalha em seu próprio pedaço de terra equilibrando o tempo entre a plantação e a produção na cerâmica. Casado e pai de duas meninas de 8 e 3 anos, ele diz que - mais do que a primogênita - a caçula já se diverte alisando o barro.
| | Obras de José Nilo e Adriano continuam contando histórias cotidianas da cidade de Caraí - Fotos Penellope Bianchi
Seu primo, Adriano Rosa do Santos, de 44 anos, também tem seguido os passos da tia. Casado e sem filhos, ele se divide entre as funções de lavrador e ceramista. O barro, a técnica, e até o endereço do local onde produzem são os mesmos. Depois do falecimento da artista, eles dois são os que mais frequentam a antiga casa da tia, tanto para cuidar do espaço, quanto para usar o forno responsável por dar vida a tantas e tantas obras.
Assim como sua tia, a arte ainda não é capaz de lhes ser a única fonte de renda. Sendo dona de trajetória inventiva ímpar, agora, seu legado seguirá sendo perpetuado pelas mãos dos sobrinhos, que terão algumas de suas peças apresentadas pela Paiol no 18º Salão de Artesanato em São Paulo, que acontece no final de agosto.
|
|
|
Nenhum comentário:
Postar um comentário