À primeira vista, o padre Júlio Lancellotti e o grafiteiro Enivo podem parecer figuras distantes. Não são. Enivo, profundo admirador do padre, passou a acompanhar sua atuação cada vez mais de perto para criar as telas que compõem a exposição “AFETO”, nova mostra do Museu de Arte Sacra de São Paulo – MAS/SP, instituição da Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Estado de São Paulo, sob curadoria de Simon Watson.
As 17 telas têm por tema as populações humildes que habitam nas calçadas, ocupações e abrigos de São Paulo. "Afeto é sobre ligações afetivas mas também sobre aquilo que nos afeta", explica o artista, citando ações beneficentes e o engajamento do padre no combate à aparofobia – hostilidade contra moradores de rua (e contra pessoas pobres de maneira geral) que se manifesta por meio de ações do poder público e privado. Algumas das telas reproduzem cenas de Lancelotti oferecendo água e comida, cuidando de crianças e conversando com os desabrigados; outras são retratos dos próprios moradores, numa narrativa que alterna desalento e esperança.
Para ambientação, Enivo foi convidado a desenhar cenas da cidade diretamente nas paredes do museu, numa espécie de afresco contemporâneo. Em cima desses desenhos em carvão, de grandes dimensões, serão penduradas as telas a óleo e spray. "A expografia que imaginamos se relaciona diretamente com seu método de trabalho nas ruas: quando ele vê uma parede nua, ele começa fazendo um esboço preparatório que depois ele sobrepõe tornando a imagem cada vez mais aparente", explica Simon Watson, "Ao contrário de seu trabalho nas ruas, aqui no museu o toque final é colocar telas prontas nas paredes do museu."
Origens da pesquisa
Seguidor do Padre Júlio Lancelotti nas redes sociais, Enivo viu-se cada vez mais comovido com sua denúncia diária das condições precárias da vida na rua e motivado por sua postura e engajamento. Primeiro, se aproximou dos fotógrafos que o acompanham - Daniel Kfouri, Lukas Juhler e Victor Angelo - e, aos poucos, passou a acompanhar algumas ações na paróquia de São Miguel Arcanjo, no bairro da Mooca. Para o artista, o padre Lancellotti atua como um elo entre a rua e a instituição, seja ela a igreja ou o museu. "Ele está o tempo confrontando um monte de gente, de órgãos, denunciando situações, sendo ameaçado. É o papel do grafiteiro também", compara Enivo.
Outro paralelo importante é feito pelo curador ao comparar as obras contemporâneas e multicoloridas do artista com algumas peças coleção permanente do museu, em especial com alguns oratórios dos séculos XVIII e XIX "Peças como o Oratório de Santa Isabel, feito por Benedito Amro de Oliveira (1848-1923) claramente trazem a mão de pintores e artistas populares, pinturas à mão livre de um mundo de árvores e flores, morros e casas", sugere Simon Watson, que não hesita em recuperar o espírito inventivo presente nas duas produções.
Projeto LUZ Contemporânea
LUZ Contemporânea é um programa de exposições de arte contemporânea que se desdobra em eventos e ações culturais diversas, públicas e privadas. Desenvolvido pelo curador Simon Watson, o projeto, atualmente, encontra-se baseado no Museu de Arte Sacra de São Paulo. Nesse espaço, LUZ Contemporânea apresenta exposições temáticas de artistas convidados, de modo a estabelecer diálogos conceituais e materiais com obras do acervo histórico da instituição. Embora fortemente focada no cenário artístico brasileiro atual, LUZ Contemporânea está comprometida com uma variedade de práticas, cultivando parcerias com artistas performáticos e organizações que produzem eventos de arte.
Exposição: “Afeto”
Artista: ENIVO
Curadoria: Simon Watson
Abertura: 18 de junho – sábado – das 11h às 14h
Período: de 19 de junho a 07 de agosto de 2022
Local: Museu de Arte Sacra de São Paulo || MAS/SP
Endereço: Avenida Tiradentes, 676 – Luz, São Paulo (ao lado da estação Tiradentes do Metrô)
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